sexta-feira, 30 de agosto de 2013

"Vós ainda não resististes até o sangue em vosso combate contra o pecado!". (Hb 12,4)

Esse texto parte de uma grande inquietação para com a forma como se vê a opinião da Igreja sobre o aborto. Confesso que o debate promovido pelo programa "Na Moral" foi o estopim para isto. Talvez o texto fique longo, mas peço a compreensão do leitor, pois é necessário que o assunto seja tratado com cautela. 

Liberdade Humana


As pessoas - ou pelo menos a maioria delas - têm autonomia, gerindo a própria vida com suas escolhas, as quais têm consequências individuais e sociais que não devem ser desconsideradas na tomada de decisão, especialmente quando delicadas. A consciência da liberdade de cada indivíduo é essencial para não deturparmos os ensinamentos da Igreja sobre assuntos tão delicados para a sociedade atual. 

A Igreja tem a missão de transmitir, a todo o mundo, o Evangelho anunciado e vivido por Jesus Cristo (cf. Mc 16,15). Após a paixão de Cristo, sua ascensão aos céus e a descida do Espírito Santo aos apóstolos são esses que dão continuidade à pregação de Jesus. (cf. At 2,14 - 41). De uma forma particular, os bispos têm a missão de zelar pela formação espiritual dos fiéis que lhes foram confiados e os presbíteros (padres) contribuem para o mesmo. A exortação realizada pelos sacerdotes (bispos e padres) durante a homilia na missa é um exemplo de zelo para com a formação espiritual dos fiéis, assim como a catequese, oral ou através dos documentos da Igreja. Assim, vemos a missão da Igreja em auxiliar os fiéis da crescerem em santidade. Contudo, seu papel não se encerra nisso. Afinal, por Cristo, a Igreja foi enviada a todos os povos, todas as pessoas. Assim, os apóstolos anunciaram Jesus Cristo àqueles que não o conheciam, e a Igreja - tanto sacerdotes quanto religiosos e leigos - dá continuidade a essa missão. 

Métodos Contraceptivos e Planejamento Familiar


A sexualidade não é abominada pela Igreja, como, infelizmente, alguns ainda pensam, mas orientada para uma vivência saudável no matrimônio. Assim, o sexo tanto está relacionado ao sinal de amor e comunhão entre os esposos como os permite participar da ação criadora de Deus Pai. O sexo encontra sua finalidade na comunhão de amor e abertura à vida. Infelizmente, o imediatismo, tão característico da sociedade atual, tem permeado também a sexualidade. Quando se está inserido em um ritmo cotidiano tão acelerado praticamente não se encontra mais sentido em esperar para se vivenciar determinadas experiências. Afinal, há apenas um querer que deve ser saciado imediatamente. Nesse contexto se vê a grande disseminação de preservativos e outros métodos contraceptivo. De uma forma indireta - ou nem tanto assim - os métodos contraceptivos favorecem o acontecimento de relações sexuais fora do matrimônio e com diversos parceiros. 

"Sede fecundos e multiplicai-vos"(cf. Gn 1,28) é a ordem dada ao homem. Afinal, os filhos são fruto do amor dos esposos, mas, infelizmente, há uma mentalidade de enxergá-los como fardos, empecilhos que privam o casal de uma vida feliz pois uma descendência maior demanda maiores cuidados, atenção, renúncias e gastos. De fato, é necessário haver um planejamento familiar para que os filhos não tenham seu desenvolvimento prejudicado pela falta de recursos, mas como realizá-lo? Não deve ser o fechamento dos esposos em si mesmo, de forma alguma! Para que os casais exercitem o diálogo, o respeito mútuo e não tenham mais filhos o que possam cuidar adequadamente há o Método de Ovulação Billings.

Aborto


O que mais me incomoda quando é proposto a legalização do aborto, tratando-o como uma questão de saúde pública, é o argumento de que é direito da mulher dispôr de seu corpo como quiser. Podemos recordar do que foi tratado sobre a "Liberdade Humana" no início deste texto. A opção pelo aborto traz, sem dúvidas, consequências tanto para a mulher como para o feto que esta carregava em seu ventre. E quanto a este, pôde escolher algo? Não. Mas não quero me prender ao que podem chamar de sentimentalismo. Prosseguindo, preocupa-me também o tratamento que o feto recebe ao ser considerado como indesejável. Abusos são de fato uma fatalidade, mas será que o aborto é realmente a solução para isso? Parece-me mais um "varrer a poeira para debaixo do tapete": não foi possível impedir que a mulher fosse privada de uma agressão - consequência de uma progressiva perda de valores humanos que cada vez mais influenciam as relações sociais de forma inacreditável - vamos, ao menos, dar-lhe o direito de abortar. A mulher é vítima de um abuso e a solução que se dá é o direito de tirar outra vida, a qual, inclusive, parte da sua própria. Estranho, não?

Incomoda-me o fato de uma pessoa - fruto de um ato de amor, ou não (nos casos de abuso) - ser considerada como indesejável, tratada de forma semelhante a um objeto descartável. A cada momento que no programa é pronunciado o termo "gravidez indesejada" eu me lembrava da atitude que se tinha para com muitos enfermos - nada agradáveis para a população em geral, ou para desenvolvimento urbano - antigamente: a marginalização, a exclusão. Não é o que, a certo nível, acontece quando pensamos o feto como "algo indesejável"? Pode até ter acontecido uma gravidez inesperada, mas "indesejada" ressoa, pelo menos dentro de mim, como um ataque à dignidade humana. 

Acredito que dentro desse assunto uma categoria consegue ser ainda mais delicada: o aborto como resposta diante de uma gravidez de risco. Não vejo outra forma de abordar o assunto a não ser através de um exemplos heroicos, provenientes de um exercício das virtudes que combatem o pensamento e atitudes centradas em si mesma: Jesus Cristo e Santa Gianna
"Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos". (Jo 15,13).

Conclusão


Primeiramente, não espero que todos concordem com o que foi exposto nesse texto, mas apenas que o tenham lido. O objetivo é tentar demonstrar as razões pelas quais a Igreja é firme em seus ensinamentos - já que normalmente é condenada antes mesmo que se conheça ou compreenda seus motivos - e não adere ao aborto e aos métodos contraceptivos em geral. A Igreja nos propõe um caminho, de forma particular aos que comungam da mesma fé, mas também a todos: a vivência da castidade através do clamor pela graça de Deus e de um exaustivo exercício das virtudes humanas. Não é caminho fácil, mas é frutuoso. Seu fim não é imediato, mas duradouro. Justamente por isso, tão incompreendido.

P.S.: Pessoalmente, fiquei muito contente com a presença de Dom Antônio Augusto. Eis um exemplo de martírio que precisaremos encontrar semelhante coragem e caridade para enfrentarmos como Igreja.